quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Epidemias

Reportagem publicada no Correio Braziliense, em 16/ 08/2009
Gripe A é apenas a mais recente de uma série de doenças que já assolaram a humanidade.


por Diego Moraes

Enquanto especialistas e médicos discutem quantas mortes ainda serão causadas pela pandemia de gripe A (H1N1), conhecida como gripe suína, o que muita gente não sabe é que o mundo convive diariamente com epidemias silenciosas e permanentes — tais como tuberculose, malária, sarampo, pneumonia, Aids… —, responsáveis por matar uma pessoa a cada seis segundos. São 10 milhões de mortos todos os anos, principalmente em países em desenvolvimento.

A falta de investimento em ações de saneamento básico é uma das principais causas para tantos óbitos em pleno século 21. “Todas são doenças passíveis de prevenção ou tratamento. São epidemias que estão escondidas, mas fazem parte do cotidiano de muitas populações”, explica o médico-infectologista Stefan Cunha Ujvari. Autor dos livros A história e suas epidemias e A história da humanidade contada pelos vírus, ele ressalta que as pessoas estão cada vez mais expostas a vírus e bactérias. E — o mais estranho — por uma escolha voluntária.

As doenças acompanham o homem desde sua origem. Mas as epidemias começaram mesmo há cerca de 10 mil anos, quando a humanidade deixou de ser nômade para viver da agricultura e da domesticação de animais. O contato com micro-organismos que habitavam esses bichos deu origem a enfermidades que seus donos não estavam devidamente preparados para suportar. A primeira grande epidemia de que se tem notícia foi a Peste de Atenas. Mas a Peste Negra, no século 14, tornou-se a mais fatal. “As condições sanitárias eram péssimas e ninguém tinha ideia do que causava a doença”, destaca Joffre Rezende, da Sociedade Brasileira de História da Medicina.

O crescimento populacional e o hábito de domesticar animais, além da facilidade de transitar pelos diferentes continentes, fazem com que os micro-organismos se multipliquem em velocidade sem precedentes. O resultado é um emaranhado de mutações que migram dos bichos para os homens. “Vivemos uma era de aumento do número de animais domesticados no mundo todo, o que pode ter ocasionado a disseminação de novos vírus”, explica o Ujvari.

A própria gripe A é um exemplo disso. O vírus H1N1 surgiu com a gripe espanhola e foi passado de homens para porcos na América do Norte. Na década passada, percebeu-se que o organismo dos suínos passou a misturá-lo com vírus de aves e também de porcos da Europa. A gripe aviária, de 2003, também foi resultado do contato de homens com aves domesticadas.

O avanço populacional em direção às florestas também contribui para acelerar esse processo. Prova disso é a recente epidemia de Sars, sigla inglesa para Síndrome Respiratóia Aguda Grave, cujo agente causador tem semelhança com um vírus encontrado num gato selvagem, apreciado como iguaria por caçadores, no sudeste asiático. A doença contaminou 8 mil pessoas e matou 774. E a expectativa é que mais vírus apareçam no mundo, com mutações ainda mais aceleradas.

Peste de Atenas
Foi a primeira grande epidemia sobre a qual há registros. Em 430 a.C. uma doença misteriosa vitimou cerca de 30% da população de Atenas, justamente no início da batalha do Peloponeso, quando a cidade estava em confronto com Esparta. O historiador Tucidides descreveu, à época, em seu livro A Guerra do Peloponeso, aquela estranha enfermidade da qual também foi vítima: “O calor intenso era tão pronunciado que o contato da roupa se tornava intolerável. Os doentes ficavam despidos e somente desejavam atirar-se na água fria. (…) A maior parte morria ao cabo de 7 a 9 dias consumida pelo fogo interior. Nos que ultrapassavam aquele termo, o mal descia aos intestinos, provocando ulcerações acompanhadas de diarreia rebelde que os levava à morte por debilidade”.

O confronto entre as duas cidades contribuiu para agravar a epidemia. “Todos os moradores estavam aglutinados, dentro dos muros de Atenas”, explica o infectologista Stefan Ujvari. Segundo o expert, a causa de tantas mortes permaneceu desconhecida até o início desta década, quando pesquisadores encontraram corpos enterrados na região e, ao estudar a polpa dos dentes dos cadáveres, encontraram DNA da febre tifoide.

Peste de Antonina
Surgiu no século 2 d.C. e matou quase um terço da população de Roma. Depois, espalhou-se pela Itália e também pela região da Gália, onde hoje é a França. Foi assim batizada em alusão ao Imperador Marco Aurélio, que estava no poder na época e era da linhagem dos antoninos. Ele mesmo acabou morto pela peste, no ano 180. Como relatou o médico grego Claudio Galeno, a doença causava “ardor inflamatório nos olhos, aversão a alimentos, sede inextinguível, inflamação da mucosa, vômitos de matérias biliosas, gangrenas parciais e fetidez do hálito” nos contaminados.

Também conhecida como Peste dos Antonios, durou cerca de 15 anos. No auge dela, quase 2 mil pessoas morriam por dia em Roma, sufocadas pelos sintomas da doença. Conforme os relatos de Galeno, contemporâneo da epidemia, os pacientes também alternavam delírios tranquilos e furiosos. O desfecho era “funesto do sétimo ao nono dia”.

Peste Negra
Foi a mais trágica epidemia da história da humanidade, considerada por muitos como um castigo divino. Recebeu esse nome devido às manchas escuras que apareciam na pele dos acamados. As condições sanitárias precárias do século 14 contribuíram para o flagelo sem paralelos até hoje. “Cerca de 30% a 40% da população da Europa foi dizimada e teve repercussão em todos os setores da atividade humana — econômico, agrário. Famílias inteiras desapareceram”, descreve o professor da Univesidade Federal de Goiás Joffre Rezende.

Também conhecida como Peste Bubônica, surgiu na Ásia e causou a morte de 5 milhões na Mongólia e no norte da China apenas no ano de 1334. Foi parar na Europa levada por navios mercantes. Os homens da época não conheciam vírus e bactérias e, sem saber que a doença era causada pela pulga dos ratos, fantasiavam teorias. Doentes foram jogados na fogueira. Famílias se isolaram nos campos. E até os judeus foram perseguidos como possíveis responsáveis pela moléstia. “Nenhuma prevenção foi válida, nem valeu a pena qualquer providência dos homens (…) Na virilha ou nas axilas, algumas inchações. Algumas destas cresciam como maçãs, outras como um ovo”, descreveu Giovanni Bocaccio, no livro Decamerão.

Varíola, sarampo e gripe
Com o avanço das navegações e a descoberta da América, batizada na época de “Novo Mundo”, os europeus importaram epidemias para os pré-colombianos. O sarampo, a gripe e a varíola mataram juntos, ao longo de quatro séculos, mais da metade da população que habitava o continente. A varíola acometeu inicialmente os povos do México, contaminados pelos espanhóis. Mas chegou também ao Brasil pelo litoral da Bahia, se espalhou pelo interior até chegar ao Rio da Prata, atingindo também os índios do Paraguai.

No início do século 20, a varíola foi o pano de fundo para resistência popular que ficou conhecida como “Revolta da Vacina”, ocorrida entre 10 e 16 de novembro de 1904, no Rio de Janeiro. Em meio aos problemas sanitários que a cidade tinha na época, o sanitarista Oswaldo Cruz convenceu os legisladores a aprovar uma lei que obrigava a vacinação contra a varíola. A população se rebelou e a cidade viveu um clima de guerra, com pelo menos 50 mortos e mais de cem feridos.

Gripe espanhola
Uma das mais importantes pandemias causadas por vírus até hoje, levou à morte entre 20 milhões e 40 milhões de pessoas — cerca de metade da população mundial — entre 1918 e 1919. Apesar do nome, especialistas ainda divergem sobre o local onde a gripe se originou. Os primeiros casos da doença foram identificados nos Estados Unidos em março de 1918. A doença chegou à Europa provavelmente em abril, levada por tropas francesas, britânicas e norte-americanas. No Brasil, a doença matou mais de 300 mil pessoas, entre elas o médium espírita Eurípedes Barsanulfo.

O vírus da gripe espanhola era o H1N1, que o homem transmitiu para porcos criados em fazendas na América do Norte, dando origem ao vírus da gripe suína. Os suínos são uma espécie de “tubos de ensaio para vírus”, capazes de misturar tipos que infectam outros animais e facilitar a mutação deles. A atual pandemia de gripe é causada pelo A H1N1, um novo tipo derivado do vírus que adoece os porcos. “Agora, o porco está devolvendo, totalmente misturado, o vírus da gripe espanhola que herdou do homem. Mas é um vírus completamente recombinado, que é transmitido apenas entre humanos”, explica o infectologista Stefan Ujvari.
Atividade:
Fazer um quadro comparativo com os itens:
1. Nome da epidemia
2. Local
3. Época
4. Sintomas
5. Celebridades acometidas pela doença.

Caso alguma informação não esteja disponível no texto, pesquisar em outras fontes.

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